Desigualdade não é uma contingência
ou um acidente qualquer. Também não é uma decorrência “natural” e “imutável” de
um processo que não nos diz respeito. Ao contrário, ela é consequência de
nossas escolhas – sociais, educacionais, políticas, culturais e institucionais
– que têm resultado numa clara e crescente concentração dos benefícios
públicos.
Nossa persistente desigualdade não
provoca apenas a acumulação de renda nas mãos de um grupo limitado; faz com que
a saúde e a educação de qualidade virem benefícios para poucos. Segundo dados
colhidos pelo IBGE, em conjunto com a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios) – que analisaram as condições de vida dos brasileiros – a fatia da
renda nacional apropriada pelos 10% mais ricos caiu nos últimos anos de 46%
para 41%. No entanto, o pedaço dos 50% mais pobres cresceu de 14% para 18%.
Já as pesquisas de Marc Morgan
Milá, um economista irlandês e discípulo de Thomas Piketty, indicam que os
governos brasileiros, na prática, jamais optaram por enfrentar a desigualdade
social no Brasil. Segundo o investigador, ela é maior do que se supunha, com
uma imensa concentração de renda retida no topo da pirâmide social. Segundo a
investigação, o grupo que representa os 10% mais ricos da nossa população
acumula mais da metade da renda nacional. Dentre os anos de 2001 e 2015, essa
fatia da população teria visto sua renda crescer de 54% para 55%.
Segundo os cálculos de Morgan, a
renda apropriada pelos 50% mais pobres também subiu nos últimos anos; de 11%
para 12% do total. No entanto, 40% da população brasileira encolheu sua renda
de 34% para 32%.
O fato é que os novos estudos
confirmam como o Brasil continua sendo um dos países mais desiguais do mundo.
Assinalam também o alto grau de concentração econômica. Segundo dados da mesma
pesquisa, o estrato mais rico da população, que corresponde a apenas 1% dos
brasileiros, abocanha 28% da renda nacional. Realizando um paralelo com outros
países, o pesquisador irlandês revelou como nos EUA as elites apreendem 20% da
renda e, na França, 11%. E ainda: se na França a renda anual dos grupos que se
encontram dentre os mais ricos é inferior a R$ 925 mil, no Brasil, a renda
média anual desses setores chega a valores equivalentes a R$ 1 milhão.
Não sou economista, e apenas
reproduzo parte destes dados com o objetivo e comprovar como o Brasil –
passados quase 30 anos da promulgação da Constituição de 1988, que previu a
distribuição da riqueza por intermédio da educação, da saúde, do saneamento –
continua sendo um país muito injusto e desigual.
Mais ainda. O que uma série de
investigações vêm evidenciando é como a carência no oferecimento de uma
educação de base de qualidade tem a capacidade de aguçar a desigualdade e nossa
intolerância social. Índices do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e do
DataFolha mostram que a sociedade brasileira, numa escala de zero a dez, atinge
atualmente um índice de 8.1 na tendência a endossar posições mais autoritárias.
Segundo Renato Sérgio de Lima, diretor presidente do FBSP, estamos diante de
uma maioria que advoga o uso da violência como forma de governo, e,
paradoxalmente, julga que essa seria a melhor maneira de “pacificar a sociedade
numa espécie de vendeta moral e política”. E quanto menor o índice de
escolaridade, maior a aposta em soluções autoritárias e pouco afeitas ao
diálogo.
Todos esses dados parecem sinalizar
que a resposta para a crise política, econômica, social e cultural em que nos
encontramos, só poderá vir de um projeto de nação mais inclusivo e igualitário.
A aposta numa formação educacional sólida, ampla e equânime é promessa de
futuro – bem sei. Mas traz consigo
um sopro de utopia que tem a capacidade de abalar o ceticismo que se abateu
entre nós. A boa utopia de uma sociedade mais informada, leitora, crítica mas
também capaz de dialogar.
A desigualdade deteriora a malha
social e tem a capacidade de vilipendiar as nossas instituições
republicanas. (Lilia Schwarcz - https://www.nexojornal.com.br/).
Um grande abraço a todos.
Ari
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